26.11.12

É pro povo participar, então?


Aconteceu há pouco tempo a audiência pública sobre o processo de licitação do Maracanã. Depois de jogar no lixo todo o investimento feito no estádio nas obras para o Pan e gastar mais de R$800 milhões de dinheiro público na sua reconstrução, o governo pretende entregá-lo à iniciativa privada. No edital, estão previstas a demolição dos estádios de atletismo e natação – muito utilizados no dia-a-dia -, do Museu do Índio e até mesmo de uma das melhores escolas públicas do Estado, tudo para abrir espaço para estacionamento e lojas com que o futuro concessionário vai faturar. Não foram chamados para discutir o modelo de concessão os maiores interessados no futuro do Maracanã: os torcedores e os clubes. Tudo foi preparado com base em um estudo de viabilidade econômica produzido exatamente pelo favorito a ficar com a administração (e os lucros) do complexo do Mário Filho pelas próximas décadas: Eike Batista.




A audiência pública aconteceu em um lugar pequeno, fechado, em dia de semana no meio da tarde, horário em que todo mundo trabalha. Ainda assim, centenas de pessoas – índios, alunos da Escola Friedenreich, torcedores, sócios do Flamengo... – apareceram por lá para protestar. A postura do governo foi ignorar, fingir que tudo correu democraticamente e dizer que vai seguir sem mudar nada. Os que foram lá, afirmou um secretário do Estado, “são uma minoria”. Não merecem ser ouvidos.

Hoje, este mesmo Estado que faz questão de ignorar aqueles que querem se manifestar na questão do Maracanã resolveu chamar o povo a participar da vida política. Não, ninguém foi convidado a discutir planos, definir prioridades, nada disso. A ideia é ter uma multidão servindo de claque para uma “manifestação” pedindo à presidente Dilma que vete a nova lei dos royalties do petróleo. Para isso, ao contrário do que aconteceu no outro caso, resolveram facilitar a vida de todo mundo para aparecer por lá: ponto facultativo, ônibus e trem de graça, shows de artistas populares para atrair a galera.

Democracia é isso aí.


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Até me parece errado o que está sendo feito, tirando tanto dinheiro dos royalties dos municípios produtores para distribuir por todos os demais. Representantes dos outros estados se tocaram que eram maioria contra os do Rio e do Espírito Santo, cresceram o olho pra cima de tanto dinheiro – vai dar pra apresentar um monte de emendas ao orçamento com aquela grana, garantindo votos na molezinha construindo quadras, praças e pontes – e passaram a mão. Tem jeito de golpe mesmo.

Mas será que, com a quantidade de dinheiro a mais que pode vir do pré-sal, realmente era preciso tanto assim de royalties para compensar estes municípios produtores pelo impacto que sofrem com a extração do petróleo? Será que não dava pra dividir alguma parte menor com o resto? Como se faz esta conta, como se mede essas coisas? Aliás, como vem sendo gasto este dinheiro ao longo dos anos? Alguém me perguntou antes o que fazer com ele, alguém está me explicando agora o que foi feito? É possível entender porque os municípios que recebem estes recursos não vêm tendo retorno em melhora de índices sociais – saúde, educação e tudo o mais? Sinceramente, não sei.

Ninguém fala nada. A campanha para sensibilizar a população para a causa, em vez de procurar informar e dar argumentos consistentes para justificar a posição dos governantes do Rio, limita-se a fazer um terrorismo desinformativo. O governador ameaça não poder bancar as obras para Copa e Olimpíadas – quando é óbvio que estes eventos não correm o menor risco, é o tipo da coisa para a qual a União certamente apareceria com recursos em caso de emergência, como aconteceu em 2007 com o Pan. Na primeira página do Globo de domingo, foi publicado que haveria cortes no bilhete único, na merenda escolar e no orçamento da polícia, o tipo de coisa que incomoda qualquer um. Mas por que justamente nestas coisas? Quem definiu estas prioridades? O povo foi consultado? Será que não escolheria economizar em outras coisas?

Enfim: a causa dos royalties talvez pareça até correta. Mas o jeito todo como levam o assunto é tão errado que fica difícil comprar a ideia. E depois do tanto que desacostumaram o povo a participar da luta por seus direitos, vir agora comprar a adesão de todo mundo de forma tão baixa é complicado.

Mas sei lá, de repente a Dilma até veta, vai saber. No fim, essas coisas são sempre decididas como se não tivessem muito a ver conosco, mesmo.


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