4.12.07

Bando de louco

Depois de tantas quedas de clubes grandes para a segunda divisão nos últimos anos, já virou até jargão o consolo que se dá às torcidas neste momento de sofrimento: “o rebaixamento pode ser uma coisa boa”. E ficam os exemplos de Botafogo, Palmeiras, Grêmio e Atlético Mineiro, que subiram de volta à elite rapidamente e com os laços fortalecidos com seus torcedores.

Pois no caso do Corinthians, os benefícios da ida à serie B aparecem em tempo recorde. Não sei nem quantas matérias já vi na imprensa falando da dor e do sofrimento dos mais de 30 milhões de corintianos. Pois é: a torcida do Timão deu um salto espetacular nos últimos dias! As pesquisas indicam que o Corinthians não tem mais que 15% da torcida nacional – isso as que dão números maiores ao bando de loucos; a do Datafolha, que é feita anualmente há 15 anos e teve sua última edição divulgada em agosto, os coloca na faixa de 12%, variando dentro da margem de erro ao longo do período. Considerando a população de 190 milhões de brasileiros, teríamos portanto de 22 a 27,5 milhões de corintianos. Como agora já se fala em “mais de 30” – ouvi até o número específico de 33 milhões -, podemos concluir que cerca de 5 milhões de pessoas se tornaram torcedores do Corinthians nos últimos dias, talvez contagiados pelas demonstrações de amor da Fiel em meio ao caos do rebaixamento. Imaginem como vai ser ao longo do ano que vem!

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Estas estimativas populacionais tão realistas são apenas um pequeno exemplo pinçado de tudo o que temos visto na mídia nos últimos dias: um verdadeiro corintianismo explícito. É fato: enquanto o Flamengo tem anunciado nos últimos dias o plano de lançar seu pioneiro canal de TV pela Internet, o Corinthians percebe que não precisa desse tipo de projeto, pois já domina os principais canais de TV aberta e fechada do país. Semana passada, o Sportv chegou ao extremo de transmitir ao vivo um treino de Nelsinho Baptista e comandados. Já o Esporte Espetacular de domingo foi largamente dedicado ao mais ilustre integrante da Segundona, com uma loooooonga retrospectiva de sua campanha pavorosa.

Ao longo da cobertura, antes da rodada, vimos matérias e mais matérias exaltando a Fiel – que deu demonstração emocionante de amor, é claro, mas que não esteve em maior número no Pacambu do que a torcida do Atlético Mineiro no Mineirão, disputando uma mera vaga na Sul-Americana em jogo de meio de semana com o possante Goiás. Os prognósticos dos comentaristas, praticamente todos, excluíam o Corinthians do rebaixamento – ninguém falou com todas as letras: EU ACHO QUE O CORINTHIANS CAI. E cheguei a ouvir diversas análises falando até da importância que teria a experiência de Vampeta nesse momento. Nêgo acredita em cada coisa!

Nunca um rebaixamento de clube grande foi tão merecido. O time do Corinthians é muito, muito, muito fraco. Tirando o goleiro e, com boa vontade, o Finazzi – que faz o seu papel de centro-avante que empurra a bola pra dentro –, não dá pra salvar ninguém. A grande promessa é o Lulinha, um garoto que, quem sabe, um dia pode ser alguma coisa. Mas, na verdade, até hoje não teve uma atuação decisiva, fez um gol de que nos lembremos, uma grande jogada digna de nota. Trata-se de um time que, mesmo quando pressiona o adversário, não dá ao torcedor de seu oponente nenhum medo de que vá conseguir marcar seu gol.

Fora os jogadores, há um técnico que tentou convencer o adversário a fazer corpo mole, avisando em campo que o jogo já não valia mais nada pra eles; uma diretoria que atrasou a entrada do time em campo em 20 minutos no jogo decisivo para levar vantagem, e que colocou um gandula pra jogar bola em campo pra parar contra-ataque do adversário; e, finalmente, uma torcida que há dois anos, em grande parte, gostava de gritar o famoso “el el el, o Kia é da Fiel”, exaltando o testa-de-ferro que a Máfia Russa enviou pra dirigir sua lavanderia monetário-futebolística tupiniquim. Pois é: este rebaixamento, além de tudo, veio pra vingar todo o futebol brasileiro de um campeonato assaltado como o de 2005. Mesmo que vá se discutir a decisão do STJD de anular os jogos (“qual seria a melhor medida, então?”) ou mesmo a absurda atuação do árbitro no decisivo Corinthians x Inter (“os juízes são ruins mesmo”), o fato é que aquele time era bancado com dinheiro obviamente ilegal. Todo mundo sabia, ninguém foi enganado.

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Agora, resta a expectativa para o tratamento que será dado ao Corinthians durante sua estada na série B. As notícias dão conta de que a Rede Globo tomará pra si o direito de transmitir o campeonato na TV aberta – o contrato já era dela, que apenas o repassava à Rede TV. Ao que parece, o plano é ter os jogos do Corinthians fora de casa sempre aos sábados de tarde, para dominar a audiência no horário. Não se sabe se a TV será capaz de dirigir tanto assim a tabela de um campeonato por pontos corridos.

E é ver se o Corinthians conseguirá retornar logo. Os grandes que voltaram logo, citados lá no início do texto, não precisaram montar grandes esquadrões para voltarem à série A. A diferença econômica entre os membros do Clube dos Treze e o resto é tão grande, mas tão grande, que fica difícil para os demais competirem – especialmente em uma fórmula sem mata-mata, com menos espaços para zebras. Ou seja, não precisa de muita coisa. Mas se tem alguém capaz de se complicar ainda mais nessa situação, é este povo que toma conta do Corinthians hoje em dia. Vai saber.

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