8.4.08

Nem vem de garfo que hoje é dia de sopa

Em mais um desses processos pedindo reparação por danos causados pela ditadura, os cartunistas Jaguar e Ziraldo acabaram de ganhar um milhão cada um, mais uma pensão vitalícia de 4 mil por mês. É justo?

Sei que ambos foram perseguidos, tiveram veículos em que trabalhavam censurados (e muito mais) e inclusive andaram sendo presos. Claro, passaram sua cota de perrengue e acredito que inclusive prejuízo financeiro. Mas merecem um milhão cada um, mais quatro mil por mês, do meu, do seu, do nosso? Sei não. De qualquer forma, o pai do Menino Maluquinho (um dos meus livros preferidos de todos os tempos) já avisou que está "se lixando" pra quem não concorda, enquanto o advogado do Jaguar diz que vai recorrer para pedir mais. Então tá, né?

Por essas coincidências da vida, a indenização dos dois saiu mais ou menos na mesma época em que vem ao mundo Ninguém sabe o duro que eu dei, documentário sobre a vida de Wilson Simonal. Este era o cantor mais popular do país até acabar sendo acusado de trabalhar secretamente para a ditadura, delatando gente "de esquerda". Sua imagem caiu em desgraça, a carreira degringolou, o homem virou alcóolatra e acabou morrendo totalmente esquecido pelo público com complicações no fígado. Com a família correndo atrás de limpar seu nome, o Estado acabou emitindo documentos atestando que não há qualquer evidência nos arquivos do SNI de que Simonal tivesse prestado qualquer serviço de informante. De fato, não há registro de alguém que tenha sido delatado pelo suposto delator e tudo parece ter sido mesmo uma grande injustiça.
Não vi ainda o filme, que teve algumas poucas exibições por aí e deve chegar ao circuito em agosto. Mas li há pouco a resenha do Bruno Maia no sobremusica. Olha só um trecho:

Nada é gratuito, desde a construção do mito da primeira parte do filme, até os depoimentos constrangedores de Ziraldo e Jaguar no final, quando ambos tratam com uma leveza que não lhes cabe, o fato de terem conduzido em grande parte a campanha de destruição de Simonal e nunca terem se retratado.

O lance é esse: o Pasquim, popular jornal que é o grande emblema tanto da luta de Ziraldo e Jaguar contra a ditadura quanto da perseguição que sofreram, foi também um instrumento para a execração pública de Simonal, que fez campanha impiedosa contra o "dedo-duro". Dando uma pesquisada por aí, caí em uma matéria da revista Época de quando Simonal já estava vivendo em leito de hospital, amargurado e no fim da vida. O repórter procurou Jaguar, que saiu-se com a seguinte edificante declaração:

"Foi um impulso meu. Ele era tido como dedo-duro. Não fui investigar nem vou fazer pesquisa para livrar a barra dele. Não tenho arrependimento nenhum"

Já a perseguição a ele - que conseguiu manter sua carreira, ganhar seu dinheiro e tem seu talento merecidamente reconhecido e remunerado - mereceu investigação, pesquisa e, claro, uma bela compensação financeira. De novo: então tá, né?

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De qualquer forma, Simonal é bonzão. Ó o Coquetel tocando a música de onde saiu o título do post:

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