19.12.06

Números interessantes

Corre agora a notícia de que o Supremo Tribunal Federal derrubou o mega-aumento de 91% dos salários dos deputados. Na verdade, a Justiça vetou que esse aumento seja dado por simples decisão das mesas; ou seja, ele terá que ser votado por todos os congressistas.

Isso ao menos faz com que cada um dos que estão loucos pelo dinheirinho extra pingando em suas contas tenha que dizê-lo em voz alta. Mas como o índice de cara-de-pau por lá está fora de controle, muito provavelmente isso acontecerá e o aumento vai sair do mesmo jeito. E aí, na próxima eleição, daqui a quatro anos, as pessoas já terão esquecido e boa parte destes aí se reelegerá - reparem que, este ano, apenas 40% da câmara foi renovada após a eleição, mesmo com a sucessão de escândalos recentes.

Agora, umas contas que eu fiz, apenas pra ilustrar como as coisas funcionam no Brasil.

Por aqui, caso o salário mínimo ganhe o máximo de reajuste que vem sendo cogitado, chegará a 375 reais. Considerando o salário atual de um deputado, ainda sem o mega reajuste, eles ganham pouco mais de 34 salários mínimos. Como são eles mesmos quem definem tanto o seu próprio pagamento quanto o salário mínimo, eles acham que merecem ganhar 34 vezes mais do que a pessoa que com menor salário no país. É a relação que definiram (e que querem mudar agora, para que ganhem 65 vezes mais do que o trabalhador mais humilde - aliás, é isso o que os ministros do STF já ganham).

Como número solto assim, talvez não queira dizer muito. Como é nos outros países?

Na Inglaterra, o salário mínimo é de 5,35 libras por hora de trabalho - trabalhando 8 horas por dia, 20 dias por mês, dá 856 libras. Um deputado da Câmara dos Comuns tem o salário de 60.277 libras por ano - o que dá, dividindo por doze, 5023 libras (não sei se lá há algo como décimo-terceiro salário, o que diminuiria esse valor mensal - é bom lembrar que os deputados brasileiros têm décimo-terceiro, décimo-quarto e décimo-quinto). Um deputado por lá, então, ganha pouco menos de 6 salários mínimos. Seria essa uma boa relação?

Talvez lá os deputados sejam modestos demais. Nos Estados Unidos, fazendo a mesma conta (salário mínimo também é por hora de trabalho, e o dado que eu consegui é o salário anual dos deputados), os congressistas recebem pouco mais de 16 salários mínimos. E na Argentina, que tem uma realidade econômica bem mais próxima da nossa, a relação também é bem parecida. Não estou colocando nas contas os benefícios extra-salário dos congressistas - os do Brasil são muito maiores do que os argentinos e americanos; os ingleses, que têm os salários mais baixos, tem ganhos por fora mais parecidos com os nossos.

O que eu acho é: o salário dos deputados no Brasil não poderia, nunca, sofrer qualquer aumento acima da inflação até que a sua relação com o salário mínimo mudasse para, pelo menos, 16/1. Se é realmente intenção de nossos representantes diminuir as desigualdades do país, deveriam começar pelos salários que eles próprios podem controlar. Então, é óbvio que o ritmo do aumento dos mais humildes precisa ser mais rápido do que os que estão no teto.

Isso é uma boa lei a ser votada: servidor público nenhum pode ter aumento percentual em seu salário acima do concedido no mesmo período ao salário mínimo, até que a relação entre o teto e o mínimo chegue a um nível razoável. A prioridade tem que ser quem está na base.

Nenhum comentário: